quarta-feira, 18 de abril de 2012

Um belo presente! Um poema sobre voz!


Ai de voz!

Por Marluci Ribeiro de Oliveira

A voz
É minha foz
E minha fonte.
De onde jorra
Meu encanto
E meu sustento.

O som da minha fronte
Que me leva adiante
E sustém, entrementes,
Cada tom, nota a nota.

O diferencial que nem se nota
Em meio ao vozerio ambiente.
Mas sobressai ao microfone,
Quando se amplifica, ambivalente.

Cicia. Balbucia. Divaga.
Soa meio doce, meio amarga.
Silente, extravasa.
Corta distâncias. Invade casas.
É o dial do alento
E da desgraça.

Minha voz me diferencia
E me guarda.
Antecede minha figura,
Mas sempre à retaguarda,
Serve à mensagem sem firula
Na ânsia do senso
Ao qual se entrega.

Nas ondas sonoras
Surfa e navega.
Vai de manso,
Sem pressa,
Rumo ao seu destino.
À mercê do meu capricho,
Se solta ou se detém,
Sem descanso.

Faço dela o meu remanso,
E o meu retrato.
Meu patuá
Secreto e franco.
Mas também me calo.
E nesse espaço
De silêncio
Falo tanto!
E, assim, pra meu espanto,
Encharco lares,
Invado cantos.
Dou recados.

Faço da voz
O meu pecado
E acalanto.
Porque dela sou escrava
Sem recato.
Recebo-a sempre em meu regaço,
Como eflúvio inevitável.
Corro, lesta, em seu encalço,
Seguindo seus passos...

Mas ela foge, à frente de tudo.
E se esvai ligeira, em seu compasso.
Por isso mesmo às vezes emudeço
E fecho então minhas comportas.
Mas ela irrompe todas as portas
E vence distâncias quando morta,
Depois de sobreviver ao meu empeço.

Por ela tenho preço.
Por ela pago.
Minha voz é meu endereço
E meu jazigo.
Um bem que afago
Qual amigo.
Um tipo de extensão
Do meu umbigo.
Um alto-falante
Que abrigo
No seio de minhas conquistas
Mais recônditas.

Sou escrava da voz
Que eu liberto
Diante do microfone
Aberto,
Trancada numa sala
De espuma.

Vivo do sonho
E dele me alimento
Na imortalidade de um segundo.
Sou produto do momento,
Filha do mundo.
Perdida na ionosfera.
Vocifero meu destino
A cada dia.
Numa frequência
De outra esfera.
Sobrevivo do som e da espera.
Na eterna sequência
De notícia e hora certa.
Por isso mesmo
Sempre alerta
Ao apagar das luzes
Da ribalta,
Pois minha voz se calará
Um dia,
Reverberando, alta,
Em outras plagas,
Rumo ao desconhecido.
Em seu trajeto mais bonito
- Livre de claves e do atrito -,
Pronta pro vôo no infinito
Que trazemos inserto em nós.
Calando, finalmente,
Nesse instante,
O sopro divino
 Chamado voz

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